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Fugir à Beira da Liberdade: Fugas em penas curtas

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28.06.2025

Por que razão um recluso arriscaria fugir da prisão quando lhe faltam poucos meses para cumprir a pena? À primeira vista, parece ilógico. Quem já passou pelo maior período da punição deveria preferir aguardar a saída pela via legal. No entanto, fugas nestas circunstâncias continuam a ocorrer, e este paradoxo levanta questões sérias sobre as falhas do sistema prisional. Estas evasões expõem fragilidades estruturais e operacionais do sistema penal. Em muitos casos, quando o fim da pena se aproxima, instala-se uma falsa sensação de segurança, tanto no recluso, que sente a liberdade ao alcance, como nos guardas prisionais, que baixam a guarda. O resultado é um cenário em que a antecipação da libertação pode, ao contrário do esperado, incentivar tentativas de fuga em vez de as desencorajar.

Este fenómeno contraria as expectativas e desafia explicações simples. Não se trata apenas de uma decisão irracional do recluso; é também um sintoma de problemas mais profundos. A sociedade espera que um preso prestes a sair em liberdade condicional não arrisque deitar tudo a perder. Espera-se igualmente que o sistema prisional garanta segurança até ao último dia de pena. Quando a realidade foge a estas expectativas, somos obrigados a questionar o que está a falhar dentro dos muros da prisão. Será culpa de uma vigilância frouxa? De um regime penal demasiado brando? Ou de uma cultura institucional complacente? Provavelmente de tudo um pouco. As respostas passam pela análise da moldura penal, do papel dos guardas prisionais e das falhas sistémicas que permitem estas fugas aparentemente sem sentido.

Penas brandas, vigilância branda?

Um dos fatores a considerar é a moldura penal curta, penas relativamente leves ou de duração menor em comparação com crimes mais graves. À primeira vista, uma pena mais branda indicaria que o crime cometido não foi dos mais severos. No entanto, quando o regime punitivo é mais permissivo, parece também haver uma menor rigidez nos controlos prisionais, criando oportunidades para a evasão. Por outras palavras, se o sistema trata determinado recluso como “pouco perigoso” devido à pena curta, existe a tendência de relaxar a vigilância, o que pode ser um erro grave. Estudos sugerem que a eficácia do controlo prisional acompanha a gravidade da pena aplicada. Quando a punição é leve, a vigilância tende também a ser mais leve e é aí que os problemas começam.

Em certos casos, esta relação torna-se evidente. Por exemplo, o ensaio de que partimos aponta o caso do homem de 57 anos, “Carlos Alves, que ontem fugiu da prisão de Sintra, onde cumpria pena por crimes de violência doméstica e posse de arma, enquanto integrava um grupo de presos em obras no exterior da prisão” (Observador, 2025), para ilustrar como, em situações onde a intervenção judicial é atenuada, acaba por ocorrer uma fragilização da fiscalização exercida pelos guardas. Ou seja, se por razões legais ou culturais um crime sério recebe uma pena relativamente curta, o sistema pode baixar a guarda, interpretando-o como menos ameaçador. Isso pode ser visto como negligência involuntária ou mesmo facilitação: práticas institucionais e rotinas acabam por prevalecer sobre as precauções de segurança. Em vez de se aumentar a cautela nos últimos meses de reclusão, quando a ansiedade e a expectativa do preso estão no auge, muitas vezes assiste-se a um abrandamento das medidas de controlo.

Essa dinâmica envia uma mensagem perigosa. Para o recluso, a punição branda pode diminuir o medo das consequências. Se a punição original foi curta, ele pode imaginar que uma eventual recaptura por fuga também não será assim tão grave. De certa forma, a pena leve pode pavimentar um terreno fértil para a insubordinação, minando o efeito dissuasor que a prisão deveria ter.........

© Observador