Quem gosta da liberdade?
Desde há uns anos, os debates sobre a cultura de cancelamento são ubíquos, mas também profundamente estéreis. É possível prever qual será o conteúdo de um texto sobre cultura de cancelamento com quase completa exactidão sabendo a identidade do autor e a sua ideologia política. Isto é de um aborrecimento atroz.
Em termos genéricos, este novo significado para a palavra “cancelamento” (que já foi, de resto, adicionado em múltiplos dicionários prestigiados da língua inglesa) pretende descrever o fenómeno em que uma multidão de pessoas reage de forma negativa a uma declaração (ou acção) que considera moralmente condenável, pretendendo com isso que o autor da declaração sofra repercussões negativas, que podem ir da reprovação social generalizada, à ostracização ou, nos casos mais graves, ao seu despedimento ou exclusão das actividades económicas e grupos sociais em que participa. Este artigo de Ross Douthat, cronista conservador residente do New York Times, parece-me equilibrado ao explicar bem os básicos do fenómeno e a colocar alguns pontos nos is (embora eu não concorde necessariamente com tudo).
Não há dúvida que o conceito parece ter surgido para descrever situações em que pessoas ou grupos de esquerda cancelavam pessoas que proferiam declarações que estes consideravam racistas, xenófobas, sexistas, transfóbicas, homofóbicas, ou insultuosas para grupos marginalizados. Ou seja, estes grupos de esquerda queriam usar o cancelamento do discurso para corrigir as injustiças sociais que eles consideram inaceitáveis. Independentemente da sua desejabilidade, a eficácia da táctica parece-me ser muito discutível.
A dificuldade da cultura de cancelamento – salvo nas raras excepções em que efectivamente há uma decisão por parte de uma empresa ou liderança para despedir alguém – é que todos aqueles que nela participam........
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