Do mito à morgue: a conta da “erva” |
Abri o YouTube para fugir ao sermão das televisões. Surpreendentemente, o algoritmo serviu-me um feed dominado por vídeos de vários canais com Lula a declarar que os traficantes são vítimas dos utilizadores. A inversão moral, em direto. Horas depois tentou corrigir e lá veio a emenda, “frase mal colocada”, mas o recado ficou. No mesmo ciclo noticioso, o zeloso compagnon de route, António Guterres, o homem do pântano, exigiu uma investigação imediata à megaoperação policial nos complexos do Alemão e da Penha, no Rio. Não é o inquérito que me choca, é a liturgia: transforma-se a lei em suspeita e a tragédia em ruído. Este ruído exporta-se bem: desarma a linguagem, confunde o público e enfraquece a autoridade da polícia, cá também. Lula baralhou. Guterres afinou a partitura. E no meio fica uma população sequestrada pelo tráfico, submetida às suas “regras”, cercada por armas e silêncio, que vive sob lei paralela e enterra os seus. É isto que os eufemismos branqueiam.
Para quem assiste em Portugal, o timing não podia ser pior. O Algarve tornou-se a via verde do narcotráfico. Merece a pena recapitular: a 8 de maio: 50 fardos, 1,7 toneladas. Dois dias depois: 93 fardos; semana acima de 3,7 toneladas. 22 de setembro: 38 fardos, mais 1,5 toneladas à entrada do rio. Não são episódios isolados. São linhas de abastecimento entre Marrocos, Andaluzia e a Costa Algarvia. Esta verdadeira autoestrada da droga tem um preço alto: vidas perdidas e segurança rasgada. O cabo Pedro Nuno Marques Manata e Silva, 50 anos, residente em Lagos, morreu em serviço quando traficantes, em narcolancha, executaram uma manobra de aríete, usando o casco como arma, e atingiram em cheio a lancha da Unidade no Guadiana. Isto não pode ser tratado como nota de rodapé. É uma linha vermelha, um limite que o país não pode tolerar. Proteger quem nos protege é dever de Estado.
Convém recordar que somos o país........