250 anos depois, Adam Smith contra a anestesia do feed

Há uma tentação específica nesta semana entre o Natal e o Ano Novo: ficar parado. É a semana em que o prefixo “pro” em “procrastinar” ganha via livre. O telefone na mão, a televisão ligada como ruído de fundo, rabanadas no prato, prendas por abrir ou já esquecidas, e o polegar a deslizar num feed que não leva a lado nenhum. É o equivalente contemporâneo de enterrar o talento e ainda bater com a pá em cima.

O problema não é descansar. Descansar é essencial. O problema é confundir descanso com entorpecimento mental. Uma coisa repõe energia. A outra apenas consome tempo. Porque o tempo, convém recordar, não é neutro. O tempo pode ser investido, desperdiçado ou enterrado. E, ao contrário do dinheiro, não dá para pedir ao banco central que imprima mais quando acaba. A boa notícia é que aproveitar o tempo não tem de ser heroico nem ascético. Não exige resoluções teatrais nem a ladainha do “novo eu”, que volta já e, em modo repeat, para a semana. Exige apenas a decisão, o compromisso, de aprender alguma coisa que dure. Ler um livro difícil. Voltar a um clássico. Não para impressionar ninguém, mas para ganhar autonomia mental.

Aprender é a primeira forma de multiplicar o talento. A segunda é partilhar conhecimento. Pois o conhecimento que não circula apodrece. Conhecimento partilhado ganha valor porque se testa, afina e melhora. Não é por acaso que quase todos os grandes pensadores escreviam. Escrever obriga a organizar ideias. Obriga a escolher. Obriga a pensar até ao fim. A terceira forma é aplicar o que se sabe no mundo real. Quem aprende melhor decide melhor. Quem melhor decide, melhor gere o risco. E quem gere melhor o risco tem mais probabilidades de transformar tempo em retorno, seja financeiro, profissional ou simplesmente liberdade de escolha. O mercado não é uma abstração. Somos nós, todos os dias, no que escolhemos, no que compramos, no que toleramos e no que premiamos. E por isso o mercado não recompensa boas intenções. Recompensa competência aplicada com paciência.

O que não podemos é ficar parados. Parados a ver o telefone como se o tempo estivesse em pausa, quando, na verdade, está a fugir. O Natal passa. As prendas perdem a graça. O feed renova-se infinitamente sem nunca dizer nada de novo. Mas o tempo que passou não volta. E é por isso que esta semana, que parece........

© Observador