Médico de família: ganhar no Milhão ou no Euromilhoes?

O Serviço Nacional de Saúde nasceu com a promessa de que ninguém ficaria sem cuidados de saúde. Quase meio século depois, essa promessa continua a ser adiada para mais de um milhão e meio de portugueses que vivem sem médico de família atribuído.

Tal como, em qualquer jogo de sorte ou de azar, há sempre quem ganhe por acaso e quem perca por doutrina, e o acesso à porta de entrada do sistema — o médico de família — tornou-se um sorteio de desigualdades.

Um país, vários sistemas

Os relatórios da OCDE e da Organização Mundial da Saúde colocam Portugal entre os países com melhor desempenho relativo ao investimento. Mas esses números escondem o essencial: a desigualdade territorial.

O professor Constantino Sakellarides tem dito que “um sistema de saúde só é verdadeiramente público se for igual para todos, em todos os lugares”. E hoje sabemos que Portugal é um país de várias velocidades sanitárias: quem vive em Lisboa ou no Porto tem mais probabilidade de encontrar um médico disponível; quem vive no interior ou nas periferias, encontra uma lista de espera e um número de utente.

Segundo o Portugal Country Health Profile 2023, há concelhos com menos de metade dos médicos de família por habitante face à média nacional.
O problema já não é falta de médicos — é a distribuição desigual, agravada pela ausência de incentivos reais para fixação em zonas carenciadas.

O ex-Ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes, recorda que “a política de saúde tem de ser nacional no princípio, mas local na ação”.
O SNS, porém, continua centralizado, preso à burocracia e aos concursos que demoram anos a concretizar-se.
O resultado é previsível: médicos que desistem do setor público, utentes sem acompanhamento e uma rede de cuidados primários que se fragmenta.

A sorte de ter quem nos conhece

Num tempo em que a medicina parece cada vez mais impessoal e digital, ter um........

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