De Sá Carneiro ao novo normal

Não tenho a certeza do ano, talvez 1979, durante a campanha das “legislativas”. Tenho a certeza do lugar: o restaurante de uns primos, em Vimioso. E lembro-me do pretexto, uma almoçarada de militantes e eleitores do PPD/PSD. A sala estava cheia e ruidosa, com os convivas, cinquenta ou sessenta, a investir fortemente nos aperitivos e na conversa. De repente, a tropa fandanga calou-se à entrada de um homem. Não houve anúncio ou ordem, só um homem baixinho e sorridente a passar a ombreira da porta e, com passos claros e um ou dois acenos ligeiros, a dirigir-se para a cadeira sob um silêncio de claustros. No instante imediato, o claustro lançou-se a gritar o nome do homem, com os dedinhos que haviam segurado o presunto agora em forma de “V”.

O homem era obviamente Sá Carneiro e eu, que com nove ou dez anos estava ali de férias e não integrava o bando de comensais, espreitava o episódio fascinado com a descoberta: pelos vistos, os seres humanos variavam em peso – e isso não dependia da balança. Após o repasto, recordo o meu pai a trocar gargalhadas e um abraço com Sá Carneiro, e eu achar aquilo ousadíssimo. E recordo um amigo da família, socialista e devoto de Salgado Zenha, confessar que se arrepiou na presença do futuro primeiro-ministro.

Não quero resvalar para a hagiografia, ou sequer para uma celebração do “carisma”,........

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