Nunca tivemos umas eleições com esta moldura. O que dificulta prever o que acontecerá no dia em que os portugueses forem chamados a depositar o seu voto nas urnas. Um processo eleitoral atípico logo na origem: a interferência do poder judicial no processo político. Não se trata de um juízo de valor, nem de insinuar conspirações, é apenas a constatação de um facto. Foi uma investigação criminal e a “Operação Influencer” que provocaram a queda de um primeiro-ministro e de um Governo sustentados por uma maioria absoluta socialista. E a capacidade da Justiça interferir no processo político não parou por aqui: já tivemos entretanto nova investigação judicial e a respetiva operação policial na Madeira, de novo derrubando um Governo, com escassos quatro meses de vida, este liderado pelo PSD.

A revolta das forças de segurança (20 mil agentes da PSP, 23 mil guardas da GNR e quatro mil guardas prisionais) entrou de rompante na campanha eleitoral. Por estes dias respira-se, até, um certo ar de insurreição: tentativa de entregar as armas, multiplicação de baixas médicas, ameaças veladas de que movimentos inorgânicos que ninguém controla não hesitarão em pisar linhas vermelhas. Chegou-se ao ponto de sugerir que o ato eleitoral estaria em causa, antecipando boicotes policiais ao transporte dos boletins e depois dos votos. Ou seja, soma-se uma interferência policial no processo político.

Há poucas dúvidas sobre quem se arrisca a pagar a maior fatura desta conjugação entre procuradores, polícias e eleições: é o socialista António Costa que ocupa o lugar de primeiro-ministro, é o PS que fica no olho do furacão. Mas, como não vivemos tempos políticos normais, não é evidente que isso beneficie, como era habitual no passado recente, a principal alternativa, ou seja, o PSD. Pelas dores da Madeira e porque há um outro ator político, o Chega, eficaz (embora simplista) no uso do descontentamento com a corrupção na vida pública ou a ameaça à segurança dos cidadãos. Veremos se Ventura sacará quase todo o proveito, ou se a sua ambição desmedida, que o leva agora a prometer tudo a todos, não o transformará na caricatura que fazia dos outros.

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Procuradores, polícias e eleições

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08.02.2024

Nunca tivemos umas eleições com esta moldura. O que dificulta prever o que acontecerá no dia em que os portugueses forem chamados a depositar o seu voto nas urnas. Um processo eleitoral atípico logo na origem: a interferência do poder judicial no processo político. Não se trata de um juízo de valor, nem de insinuar conspirações, é apenas a constatação de um facto. Foi uma investigação criminal e a “Operação Influencer” que provocaram a queda de um primeiro-ministro e de um Governo sustentados por uma maioria absoluta socialista. E........

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