O dia da salvação

Irene espreita o relógio de parede por cima da cabeça do professor e, enquanto espera pelo último salto do ponteiro grande, parte para longe. Agora, está à beira do Cinema Águia e a Avenida Eduardo Mondlane apaga-se à sua frente, tão extensa e cheia de gente.

– Dá-me lá dinheiro, tio.

O homem para e fica a olhar para ela.

Irene recua um passo, criando espaço para que ele realize os pensamentos e também para ter campo de fuga se for necessário.

– Pelo menos dá-me um rebuçado, tio.

Ao cabo dum instante, o homem reage:

– Se vieres comigo, levo-te a um lugar onde te dão muito dinheiro.

Estávamos na época do Kapinga, o grande bandido da Zambézia, que batia, roubava e matava ao vivo, fosse quem fosse, diante de quem fosse, sem evidenciar a mínima hesitação. As crianças eram instruídas para não falar nem aceitar nada de desconhecidos, não só porque qualquer desconhecido é sempre um universo de........

© JM Madeira