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A “opção batista”: discipulado, comunhão e disciplina no reino de Cristo

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18.12.2025

Vivemos em um tempo de fragmentação moral, descristianização cultural e isolamento espiritual crescente. Diante desse cenário, muitos cristãos buscam estratégias de reconstrução comunitária capazes de preservar a fé e transmitir sua herança espiritual. A resposta mais conhecida é a “opção beneditina”, de Rod Dreher, que propõe uma espécie de retirada estratégica para comunidades disciplinadas e liturgicamente estruturadas, inspiradas no monasticismo. Embora Dreher perceba corretamente a profundidade da crise cultural, sua solução é insuficiente. Ela parte da suposição de que os cristãos precisam de estruturas paralelas ao mundo para sobreviver, quando o Novo Testamento afirma que a estrutura primária da vida cristã não é o mosteiro, mas a igreja local.

Foi justamente nesse ponto que, nas últimas décadas, vozes como Mark Dever, Jonathan Leeman e Bobby Jamieson desempenharam papel decisivo. Esses pastores e teólogos mostraram, de maneira bíblica e prática, o que Dreher não percebeu: a resposta mais profunda à crise não está em comunidades alternativas, mas na recuperação da igreja local como instituição ordenada por Cristo. O projeto das 9 Marcas, liderado por Dever, demonstrou que a fidelidade cristã depende da reforma contínua da igreja onde Cristo exerce sua autoridade. Nessa visão, uma igreja saudável cultiva pregação expositiva, uma leitura unificada da Escritura, clareza no evangelho, entendimento correto da conversão e do evangelismo, membresia responsável, disciplina restauradora, discipulado intencional e liderança plural de presbíteros. Oração perseverante e compromisso missionário brotam naturalmente dessas marcas e as sustentam. Esse movimento, mais do que qualquer outro em nossa geração, revitalizou o que aqui chamo de “opção batista”.

A “opção batista” oferece uma resposta mais bíblica, mais missionária e mais realista. Mais bíblica porque não busca modelos extrabíblicos de espiritualidade, mas se ancora no padrão neotestamentário de corpo, assembleia, mutualidade e missão. Mais missionária porque não propõe fuga cultural, mas testemunho público. E mais realista porque reconhece, como esses autores têm reiterado, que a vida cristã é sustentada pela graça ordinária ministrada pela congregação – não por regras ascéticas, mas por Palavra, sacramentos, disciplina e comunhão. O problema do nosso tempo não é a falta de mosteiros, mas a fragilidade das igrejas. A alternativa verdadeira não é retirar-se, mas fortalecer congregações regeneradas que vivam no mundo como embaixadas do Reino.

A opção batista começa no discipulado. Discipular não é impor uma rotina espiritual artificial, mas aprender a viver sob a autoridade de Cristo junto ao seu povo. Aqui aparece com nitidez a superioridade dessa abordagem em relação à proposta de Dreher: enquanto a opção beneditina tende a formar cristãos moldados por regras externas, a opção batista forma cristãos transformados pela Palavra aplicada no convívio da igreja. O monasticismo depende da estrutura; o discipulado congregacional depende da graça. A obediência não é sustentada por coerção ou isolamento, mas pela convicção compartilhada do evangelho. O Novo Testamento apresenta o discipulado como uma caminhada comunitária: ninguém amadurece sozinho. Cada culto se torna teologia em prática; cada encontro fraterno, um espaço de encorajamento, exortação, confissão e alegria partilhada. A espiritualidade bíblica é relacional, orgânica e missionária, não enclausurada.

A resposta mais profunda à crise não está em comunidades alternativas, mas na recuperação da igreja local como instituição ordenada por Cristo

A segunda marca é a membresia. A opção beneditina procura formar microcomunidades estáveis por afinidade; a igreja bíblica, porém, se forma por aliança pública. Como Dever e seus colegas insistem, entrar em uma igreja é um ato teológico, não sociológico. A membresia define quem representa Cristo, estabelece limites éticos e produz responsabilidade mútua. Isso faz da opção batista uma alternativa mais bíblica, que corresponde ao padrão de Atos e das epístolas, e mais missionária: a igreja não se torna um refúgio contra o mundo, mas uma vitrine do evangelho para o mundo. A membresia, bem praticada, não forma guetos; forma testemunhas.

A disciplina eclesiástica é outro ponto em que a opção batista supera a beneditina. Dreher enxerga proteção na construção de muros culturais; o Novo Testamento coloca a proteção na disciplina amorosa da congregação. Aqui o trabalho de Leeman em vários livros é inestimável: ele articulou como a disciplina é expressão de autoridade delegada por Cristo e instrumento de amor restaurador. A disciplina bíblica não é punitiva, mas redentora. Mosteiros podem impor regras, mas não podem exercer a autoridade espiritual conferida à assembleia local. A opção batista é, portanto, mais fiel à........

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