Segundo o Fundo Monetário Internacional, a economia portuguesa vai crescer 2,6% em 2023 (uma inegável melhoria face ao 1% anteriormente anunciado). E, em sentido similar, a Comissão Europeia aponta para um aumento de 2,4% (mais do que duplicando a prognose anterior).
As notícias menos más ficam-se, contudo, por aí. Porque uma análise mais fina dos dados gera, de imediato, motivos de forte preocupação.
Assim, os números revelam uma travagem significativa face ao valor apurado em 2022 (6,7%), que poderá decrescer, em 2024, para 1,8%. Ou seja: nesse período de três anos pior do que nós apenas a Irlanda.
Em 2024, o PIB per capita nacional (expresso em paridades do poder de compra) poderá ser de 78,6%. O que significa que, desde 2019, a nossa convergência com a média europeia deverá ser muito reduzida ou, até, nula.
Tudo indica, também, que mais um dos parceiros da União Europeia nos ultrapassará – desta feita a Roménia, que não só crescerá mais do que nós, como atingirá os 80,9% daquela média. Recorde-se que a Roménia só aderiu em 2007 e que, em 2000, o seu PIB era de apenas 26,4% da União Europeia (contra os então 85% de Portugal).
Nesse mesmo ano – 2000 – Portugal ocupava a 15.ª posição na escala dos Estados-membros com maior rendimento real por habitante. Em 2022 tínhamos descido para 21.º lugar e, em 2024, arriscamo-nos a cair para 24.º (em 27…).
No que toca ao mercado de trabalho, as notícias também não são animadoras, pois, no último trimestre de 2022, Portugal foi, em conjunto com a República Checa, a Lituânia, a Letónia e a Hungria, um dos poucos Estados-membros em que se verificou uma contração no emprego. E, a par da Hungria, do Luxemburgo, da Lituânia e de Chipre, registou um aumento da taxa de desemprego, o que, e cito a Comissão, “sugere que os mercados de trabalho começaram a arrefecer nestas economias”.
A tudo isto acresce a perda do poder de compra, por força do aumento da inflação e do incremento dos juros dos empréstimos à habitação, domínio especialmente sensível, uma vez que o nosso País é daqueles em que é maior o peso dos contratos com taxas variáveis.
Por seu lado, diz-nos o Instituto Nacional de Estatísticas que no primeiro trimestre deste ano, e por comparação com o período homólogo do ano passado, a remuneração média mensal cresceu em termos nominais 7,4%, o que significa que a perda de valor real será da ordem dos 0,6%.
Mas, se olharmos apenas para o que se passa com os trabalhadores da Administração Pública, a deterioração é bem mais significativa, já que a desvalorização de rendimentos atinge os 2,5%.
Ganhando menos, os Portugueses estão a ser prejudicados, também, no que diz respeito à aplicação de rendimentos junto dos bancos.
Com efeito, a taxa de juro média dos novos créditos à habitação em Portugal foi umas das que mais subiu na zona euro. Diferentemente, quando se trata de remunerar os depósitos, a taxa de juro média a mais de um ano é das mais baixas dessa mesma zona.
Resultado desta discrepância: nos primeiros três meses deste ano, e no conjunto dos cinco principais bancos nacionais, a margem financeira – que é, precisamente, a diferença entre o que pagam nos depósitos e o que cobram nos empréstimos - atingiu o exorbitante valor de 2 mil milhões de euros. E os lucros 920 milhões.
É isto ilegal? Não. É imoral? Sim. Porque os bancos não podem ignorar as dificuldades que as famílias atravessam, bem sabendo, além do mais, que alguma melhoria da situação só deles depende – aceitar ter menos lucros, aumentando o rendimento do dinheiro que aquelas lhes confiam.
Além do mais, é uma atitude pouco inteligente. Porque os bancos, em larguíssima medida, alimentam-se desse dinheiro, que não é seu. E, a continuarem assim, talvez o feitiço se volte contra o feiticeiro. É que, entre Janeiro e Março, os Portugueses retiraram dali 7,6 mil milhões de euros, aplicando-os em certificados de aforro, cuja taxa de remuneração é muito mais elevada. E, em idêntico intervalo temporal, foram investidos neste instrumento de poupança para cima de 9 mil milhões de euros – um recorde absoluto.
No meio de tudo isto, onde anda o Banco de Portugal, sempre tão pressuroso quando se trata de dizer aos cidadãos e às empresas que têm de saber acomodar-se aos sucessivos aumentos dos juros dos empréstimos, mas que tão pouco vocal é a exigir aos bancos que alterem a sua atitude?
Em suma: os números não mentem. E o que deles resulta é transparente. O País está cada vez mais empobrecido. E a situação só não é pior, porque a atividade turística – que, felizmente, depende sobretudo do dinamismo dos empresários e pouco das políticas públicas – continua em crescendo, para lá até do expectável.
Com o Governo, infelizmente, não podemos contar. Reformas coerentes e corajosas, nem pensar. Medidas adequadas a combater a crise, nem vê-las. E nem sequer no que toca à execução do “famoso” PRR, um mínimo de capacidade é demonstrado. É que, como indica o Conselho de Finanças Públicas, comparativamente com o previsto no Orçamento do Estado para 2022, em que se antecipava que a despesa a realizar atingisse os 3.293 milhões de euros, o grau de execução situou-se abaixo dos 25%, traduzindo um desvio negativo de 2.501 milhões de euros.
Estamos, pois, à deriva. E à deriva continuaremos enquanto este Executivo permanecer em funções. Mas, como sempre, cá estaremos, todos, para pagar a conta.