1. Estamos em período dito de pré-campanha eleitoral, mas de facto em plena campanha eleitoral. Como sempre acontece desde que são marcadas eleições. De facto, o período oficial da campanha só se distingue por certos direitos e deveres legais, visando facilitar a informação eleitoral e assegurar a igualdade possível entre candidaturas. Por exemplo, através dos tempos de antena dos partidos. Outrora importantes, hoje muito menos. Muito mais são os debates. Nos quais, sobretudo nos televisivos, têm especiais responsabilidades jornalistas, que amiúde não têm estado à altura delas – mas a isso voltarei.

Neste período de pré-campanha, além da propaganda habitual, avultam duas coisas: saber quem são os candidatos e quais são os “programas eleitorais”. Vejamos o que, telegraficamente, me parece justificar-se dizer a esse propósito.

2. Quanto aos candidatos não há surpresas assinaláveis – o que, aliás, não é surpresa… Do que se tem falado mais é da “transferência” para o Chega, inclusive para cabeças de lista, de alguns deputados e militantes conhecidos do PSD. O que é menos positivo para o Chega do que negativo para o PSD – de que também “saiu” André Ventura. Porque, além do resto, dá ideia de uma espécie de “contiguidade” entre os dois partidos: muda-se diretamente de um para o outro não como se fosse um grande salto, mas só um passinho mais para a direita. Ou seja: não da social-democracia (em todo o mundo pelo menos centro/centro-esquerda) para a extrema-direita, mas de uma direita moderada para outra imoderada… O que creio só ter “leituras” favoráveis a um Chega que as circunstâncias e certo jornalismo/comentarismo estão a levar ao colo.

3. Em geral, parece-me que as listas dos vários partidos são as expectáveis. A AD é um caso especial. Da sua antepassada tem o nome. Mas comparar os líderes dos três partidos que há 45 anos a constituíram com os de agora é quase impossível: um contraste tão flagrante como assustador, em particular quanto à sua qualidade. E, além disso, sobretudo o CDS de Nuno Melo e o PPM de Nuno da Camara Pereira – o que têm a ver com o CDS de Freitas do Amaral e o PPM de Gonçalo Ribeiro Telles?…

Algo de semelhante acontecendo quanto aos independentes. Vejo como positiva a intenção de os integrar, mas enquanto na antiga AD Medeiros Ferreira e António Barreto tinham um apreciável currículo político, e alargavam, à esquerda, o espaço da coligação, nada disto sucede agora. Acresce que o PSD não tem nas listas figuras apoiantes de Rui Rio com peso específico e que as valorizariam – como, por exemplo, Paulo Mota Pinto. Enquanto o PS conseguiu listas de efetiva unidade do partido, sem quaisquer exclusões, com José Luís Carneiro e outros seus apoiantes à frente em vários círculos – e ainda o regresso, ao Parlamento, de figuras como Francisco Assis, e às lides partidárias, como António Vitorino.

4. Quanto aos programas eleitorais, está a falar-se mais deles do que em ocasiões anteriores. Inclusive em recuados tempos. Quando, história verdadeira, Mário Soares, em período de campanha, perguntou a Almeida Santos o que andava ele a fazer, face à sua resposta – “ando a fazer o programa eleitoral” – o então secretário-geral do PS disse-lhe: “Deixe lá isso, que programas eleitorais ninguém os lê.”

Torna-se, porém, indispensável distinguir programas eleitorais de promessas eleitorais. Porque um programa exige dizer como e com que meios podem atingir-se os objetivos definidos. Propor-se aumentar salários, pensões, reformas, dotações para a Saúde, a Educação, etc., ou seja, aumentar exponencialmente as despesas e ao mesmo tempo diminuir os impostos, isto é, as receitas – não constitui um programa, mas uma simples aldrabice. Como pura aldrabice é dizer que podem pagar-se os milhares de milhões de euros do custo de certas medidas, com as verbas resultantes de um hipotético mais eficaz combate à corrupção.

5. Certamente teremos “uma campanha alegre”, no sentido eciano. Seria bom que ela fosse também alegre, no sentido corrente da palavra, pelo seu nível político e pela sua qualidade democrática. É difícil. Mas ao menos que não seja “triste”…

À MARGEM

O incomparável, o inadmissível

Os acontecimentos na Madeira, com acusações de corrupção e outros crimes aos presidentes do Governo Regional e da Câmara Municipal do Funchal, levaram alguns políticos a lembrar, ou a invocar, o que se passou com António Costa (AC) – para defender que Miguel Albuquerque tinha de se demitir. Não vou entrar no “caso” – apenas saliento que ele não tem rigorosamente nada a ver com o de AC. Não é só, como disseram, o da Madeira ser mais, ou muito mais, grave: neste “caso” é feita (bem ou mal, ver-se-á) a imputação de crimes concretos por alegados atos concretos, que teriam causado grandes prejuízos ao erário público e ao País; no caso da “investigação” a AC não lhe é feita nenhuma imputação nem ação concreta… nem sequer abstrata! E é inadmissível o que aconteceu, levando à demissão do primeiro-ministro, e agora a Duarte Cordeiro recusar ser candidato a deputado.

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Uma campanha – alegre ou triste?

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01.02.2024

1. Estamos em período dito de pré-campanha eleitoral, mas de facto em plena campanha eleitoral. Como sempre acontece desde que são marcadas eleições. De facto, o período oficial da campanha só se distingue por certos direitos e deveres legais, visando facilitar a informação eleitoral e assegurar a igualdade possível entre candidaturas. Por exemplo, através dos tempos de antena dos partidos. Outrora importantes, hoje muito menos. Muito mais são os debates. Nos quais, sobretudo nos televisivos, têm especiais responsabilidades jornalistas, que amiúde não têm estado à altura delas – mas a isso voltarei.

Neste período de pré-campanha, além da propaganda habitual, avultam duas coisas: saber quem são os candidatos e quais são os “programas eleitorais”. Vejamos o que, telegraficamente, me parece justificar-se dizer a esse propósito.

2. Quanto aos candidatos não há surpresas assinaláveis – o que, aliás, não é surpresa… Do que se tem falado mais é da “transferência” para o Chega, inclusive para cabeças de lista, de alguns deputados e militantes conhecidos do PSD. O que é menos positivo para o Chega do que negativo para o PSD – de que também “saiu” André Ventura. Porque, além do resto, dá ideia de uma espécie de “contiguidade” entre os dois partidos: muda-se diretamente de um para o outro não como se fosse........

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