i) A análise de grandes números da estatística Eurostat de 2022 é inequívoca quanto à enorme vantagem de Espanha-Madrid: no ano 2050, o país vizinho terá 5,2 vezes a população de Portugal (49,3M X 9,4M), com a estimativa no período 2040-2100 a considerar uma suave queda espanhola (-3,4%) e uma acentuada queda nacional (-22,5%). No final do século o diferencial entre os dois países sobe para 5,7 vezes (45,8M X 8M).

A comunidade de Madrid tem hoje mais do dobro da população da área metropolitana de Lisboa (6,8M x 2,9M) e um PIB per capita à volta de 50% superior, o que significa que, além de serem mais, os madrilenos têm, também, mais propensão para viajar. No ano 2050, a diferença populacional acentuar-se-á (8,5M X 3,2M), subindo Madrid 1,7M contra Lisboa apenas 0,3M.

ii) A análise da competitividade turística urbana (Urbantur) clarifica que Madrid em 2022 já ultrapassou a campeã Barcelona: o relatório espanhol avalia 63 critérios/6 pilares. Madrid atinge na classificação 138,6 e Barcelona 136.

iii) A valência HUB do aeroporto Madrid-Barajas é superior à valência HUB de Lisboa: Madrid é a base do grupo IAG (British/Ibéria/Vueling/Air Lingus/Air Europa) para o mercado-LatAm, no qual alcança uma quota de 25%, que deverá subir quando a recente integração da Air Europa começar a surtir efeito.

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O HUB Lisboa é a base da TAP, pequena transportadora cuja frota não pode crescer (por estar estatizada) e que está à venda. Mesmo que a TAP entre numa companhia do tipo Lufthansa, o que sucederá é não mais que ganhar a sobrevivência com parco crescimento (vide Swiss, Air Austrian e Brussels do mesmo grupo). O volume de tráfego de Lisboa crescerá através de ligações diretas, baixando continuadamente a percentagem em trânsito.

Olhemos primeiro para a realidade: no ano anterir à pandemia, o HUB Madrid alcançou 62M, o dobro do HUB Lisboa com 31M. A média de passageiros por voo foi sensivelmente a mesma (145).

2.1- A capacidade-limite do HUB Madrid-Barajas é de 102 milhões de passageiros: o sistema de dois pares de paralelas – que fazem entre si um ângulo – tem uma capacidade de 100mov/h (Aena), o que lhe permite ir até 600.000mov/ano. Com a prevista média por voo de 170 passageiros, atingirá 102M, assim mais 40M que antes da pandemia ( 64,5%).

O plano de expansão 2016-2026 (1.570M€) em curso para 80M, é confinado aos terminais (ampliação/modernização) visto o seu sistema de pistas não poder ser aumentado. Ao plano foi agora aditado um terminal de junção dos existentes T1-T2-T3 (custo 800M€) a concluir em 2031. E, depois, irá aditando à medida das necessidades até 100-105M.

2.2 – No ano 2031, o HUB Madrid-Barajas terá uma capacidade instalada superior a 80M: o aeroporto é composto por dois núcleos, o T1-T2-T3 (o inicial) e o novo T4-T4S, interligados por bus (percurso 12min pelo exterior do aeroporto). Só agora irá construir a sua “air-city” até 60ha junto ao T4.

2.3 – A capacidade do HUB Alverca-Portela é de 85(90)M de passageiros: o aeroporto proposto é constituído por dois núcleos, Portela (o inicial) e o novo Alverca, que serão interligados por comboio-automático (percurso 12min pelo exterior do aeroporto como Madrid, mas com superior comodidade). Portela tem hoje uma “air-city” de 15-25ha e, no novo núcleo, será feita uma outra com 35-45ha, ou seja, a “air city” Lisboa terá a dimensão da de Madrid.

A capacidade do hub nacional vai até 105mov/h e o volume a 85M porque, propositadamente, se baixa o tráfego da Portela, onde se coloca um teto até 120.000mov (20M com 170 passageiros) e em Alverca 380.000mov (65M). Se algum dia fosse necessário (não é de todo expectável), tem como folga 30.000mov, deste modo indo até 90M (apenas 10% inferior a Madrid).

A CTI recorre à projeção de uma empresa não-especializada (TIS) em tráfego aéreo. Para a localização mais perto do centro (HUB Portela com metro), a que compara com o HUB Madrid-Barajas com metro, estima no ano 2050-cenário central 85M ( 174%) e no 2050-cenário forte 108M ( 248%) e, em 2086, respetivamente 123M ( 297%) e 142M ( 358%).

Ora, por um lado, a projeção VINCI de uma empresa da especialidade feita antes da pandemia e da segunda invasão da Ucrânia, previa no ano 2050 pouco mais de 50M e atingir no ano 2062 (final da concessão) um tráfego de 67M, sendo, pois, de esperar um abaixamento. E, por outro, a projeção Eurocontrol após pandemia e já considerando o seu efeito comportamental/redução de emissões CO2, indica para Portugal e Espanha um crescimento anual médio de 0,8%, o que significa, em 2050, que Madrid irá a 85-90M ( 28M) e Lisboa a 42-45M ( 14M); se formos otimistas, Lisboa a 50M ( 19M), no máximo.

Pela metodologia CTI, o crescimento de Madrid será com certeza mais forte que o de Lisboa. No entanto, admitamos, que é igual. Então, no ano 2050, Madrid já terá no cenário central a estratosférica procura de 170M (o dobro da prevista) e no cenário forte 216M. E, no ano 2086, no cenário central 246M e no cenário forte 284M. A ser assim, como Barajas esgota com 102M, as autoridades espanholas já estariam neste momento a construir mais um mega aeroporto de capacidade até 180M, cuja primeira fase (110M) teria de abrir o mais tardar até 2035.

O exemplo de Madrid não é suficiente? Vejamos então a metrópole Paris, onde antes da pandemia os seus dois aeroportos somaram 108M. Segundo a CTI, já em 2050, no cenário central Paris atingiria 300M e no cenário forte atingiria 375M. Porém, o que está realmente a acontecer, é que Paris está só a modernizar os dois aeroportos para o pico dos JO-2024 com uma capacidade disponível no patamar de 125M. E, até ao ano 2050, nada de expressivo aditará (em 2021 desistiu de um novo terminal).

Em 2010, em plena crise financeira, o LNEC-equipa 2007 considerou previsão 2050-42M e propôs um aeroporto em Alcochete até quatro pistas (120mov/h), cidade aeroportuária de 1.000ha, a maior ponte rodoferroviária mundial (Chelas-Barreiro) e, ainda, um comboio AV Lisboa-Porto com acrescento ao percurso de 50km. O país só parou à beira do precipício porque a troika o impediu.

Em 2024, a CTI torce os números até à raia do absurdo de Lisboa ultrapassar Paris. É imperativo juntar vozes a vocalizar bem alto que “o Rei vai nu”, para que a fatura não venha a ser endereçada aos “suspeitos do costume”, ou seja, aos contribuintes portugueses.

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Aeroporto de Lisboa - a miragem das projeções

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09.02.2024

i) A análise de grandes números da estatística Eurostat de 2022 é inequívoca quanto à enorme vantagem de Espanha-Madrid: no ano 2050, o país vizinho terá 5,2 vezes a população de Portugal (49,3M X 9,4M), com a estimativa no período 2040-2100 a considerar uma suave queda espanhola (-3,4%) e uma acentuada queda nacional (-22,5%). No final do século o diferencial entre os dois países sobe para 5,7 vezes (45,8M X 8M).

A comunidade de Madrid tem hoje mais do dobro da população da área metropolitana de Lisboa (6,8M x 2,9M) e um PIB per capita à volta de 50% superior, o que significa que, além de serem mais, os madrilenos têm, também, mais propensão para viajar. No ano 2050, a diferença populacional acentuar-se-á (8,5M X 3,2M), subindo Madrid 1,7M contra Lisboa apenas 0,3M.

ii) A análise da competitividade turística urbana (Urbantur) clarifica que Madrid em 2022 já ultrapassou a campeã Barcelona: o relatório espanhol avalia 63 critérios/6 pilares. Madrid atinge na classificação 138,6 e Barcelona 136.

iii) A valência HUB do aeroporto Madrid-Barajas é superior à valência HUB de Lisboa: Madrid é a base do grupo IAG (British/Ibéria/Vueling/Air Lingus/Air Europa) para o mercado-LatAm, no qual alcança uma quota de 25%, que deverá subir quando a recente integração da Air Europa começar a surtir efeito.

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O HUB Lisboa é a base da TAP, pequena transportadora cuja frota não pode crescer (por estar estatizada) e que está à venda. Mesmo que a TAP entre numa companhia do tipo Lufthansa, o que sucederá é não mais que ganhar a sobrevivência com parco........

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