É difícil adivinhar para que lado cairão os votos dos mais novos, mas uma coisa sabemos: há pouco entusiasmo nas novas gerações. Os grandes partidos falam para as claques de sempre e enredam-se em discussões que pouco ou nada dizem aos mais novos. Os comentadores, ainda pior. Avaliam pormenores nos quais ninguém reparou e fazem leituras muito próprias sobre meia hora de duelos ensurdecedores que requerem muita paciência, disciplina e sacrifício aos próprios e aos que assistem. Tentam explicar o que não foi dito e aquilo que foi argumentado, assim como a postura, os estilos, as gafes e as estratégias bem ou mal conseguidas. Comentar debates passou a ser um debate entre comentadores. Em casa, comentam-se os comentários e andamos num sem fim de análises de análises.

O futebol chegou à política e ultrapassou-a. O polígrafo é novo VAR e o tom é exatamente o mesmo. Só faltam as flash interviews no final dos debates para que a comparação fique completa, em que os candidatos suados, depois de mais um duelo, explicam o que correu mal e o que podia ter corrido melhor, garantem que é tudo um trabalho de equipa e que prognósticos só no final do dia das eleições. Fica a ideia.

Enquanto isto os nossos filhos mergulham a cabeça nos telemóveis e se entretêm com os TikTok de André Ventura. Não querem saber de discussões estéreis e têm pouca disponibilidade para avaliar cenários pós-eleitorais. Não entendem o que cada um dos candidatos defende ou ao que vem e só levantam a cabeça se cheirarem sangue ou guerrilha. Aquilo que os prende são frases curtas e concretas, se possível em formato PowerPoint e com gráficos animados. O Word e a retórica estão fora de moda e do seu tempo. Se uma TED Talk dura dez minutos e consegue prender uma plateia com informação nova e interessante, eles não percebem porque é que os políticos não fazem o mesmo. O estilo de linguagem oca, o discurso redondo e pouco convincente, não prendem aos ecrãs. Ninguém os ouve. Os tempos são outros e o estilo dos anos 80 protagonizado por políticos que não saíram dos anos 90, tinha de dar asneira.

As redes sociais criaram nichos, e nichos onde só os mais novos sabem navegar. Se antes os políticos passeavam pelos liceus em vésperas de eleições onde os mais novos os recebiam organizados em núcleos de estudantes partidários, hoje é nas redes e nas plataformas que eles esbarram com os novos eleitores. E aqui as mensagens são difundidas em modo de entretenimento. Prendem, fazem rir, geram emoções e gravam perceções difíceis de destruir. Quem não estiver a fazer campanha no submundo digital, não existe para os mais novos. Em minha casa assistimos ao último debate acompanhados com uma taça de pipocas. Foi um tédio. Ao fim de dez minutos, as cabeças mergulharam nos telemóveis e as pipocas desapareceram. Em vez do debate, aquilo que os prendeu foram os comentários, os memes e os reels que foram aparecendo nas redes sobre os debates que eles desistiram de assistir.

Enquanto a democracia doméstica não chegar ao digital, serão os pensionistas a decidir eleições e os jovens irão continuar com as cabeças mergulhadas nos telemóveis. E não são eles que estão alheados da política.

QOSHE - Só existe quem está no TikTok - Inês Teotónio Pereira
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Só existe quem está no TikTok

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26.02.2024

É difícil adivinhar para que lado cairão os votos dos mais novos, mas uma coisa sabemos: há pouco entusiasmo nas novas gerações. Os grandes partidos falam para as claques de sempre e enredam-se em discussões que pouco ou nada dizem aos mais novos. Os comentadores, ainda pior. Avaliam pormenores nos quais ninguém reparou e fazem leituras muito próprias sobre meia hora de duelos ensurdecedores que requerem muita paciência, disciplina e sacrifício aos próprios e aos que assistem. Tentam explicar o que não foi dito e aquilo que foi argumentado, assim como a postura, os estilos, as gafes e as estratégias bem ou mal conseguidas. Comentar debates passou a ser um debate entre comentadores. Em casa, comentam-se os comentários e andamos num sem fim de análises de análises.

O futebol chegou à........

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