Robert Badinter tinha 15 anos quando o pai foi deportado de Lyon para um campo nazi, de onde nunca regressou. É inevitável que a forma intensa como viveu a ocupação e o holocausto tenham influenciado muito do seu percurso e moldado a ideia de um forte sentido de justiça que lhe ficou colado à pele. O pai da abolição da pena de morte em França morreu no passado dia 9 e a homenagem que lhe foi prestada, esta semana, simboliza bem os tempos de forte polarização que vivemos.
Crítica dos extremismos, como o marido, a filósofa Elisabeth Badinter pediu que a União Nacional e a França Insubmissa não participassem na cerimónia de Estado. O partido de Marine Le Pen, pelas razões óbvias de promover a intolerância e a xenofobia. Quanto ao movimento de extrema-esquerda liderado por Jean-Luc Mélenchon (que recusou o pedido e se fez representar), a viúva do ex-ministro da Justiça considerou que tem contribuído para o crescimento do antissemitismo na sociedade francesa.
O incidente originou múltiplas reflexões sobre a responsabilidade da política na defesa dos valores democráticos e da capacidade de diálogo sobre temas fraturantes como a emigração ou o conflito israelo-palestiniano. Num tempo em que as redes sociais pesam muito na forma de comunicar e de informar, cada vez mais nos agrupamos em comunidades com posições semelhantes e tende a perder-se a capacidade de ouvir os argumentos de quem pensa de forma diferente. Fechados numa visão monocromática do mundo, temos cada vez mais dificuldade em perceber a diversidade de um outro olhar.
Robert Badinter poderia ter-se deixado contaminar pelo ódio, como acontece a tantos que se debatem com as cicatrizes da violência, mas transformou a sua vida num permanente combate por uma sociedade mais humanista e civilizada. Os extremismos, pelo contrário, alimentam-se da raiva. Não é fácil perceber como se combate o seu efeito destrutivo, mas só criando pontes e defendendo o direito às diferenças será possível ir secando as raízes do mal.