À semelhança do Sistema Nacional de Saúde (SNS), também o setor do medicamento necessita de uma urgente e profunda reforma onde caiba a sua total reestruturação, uma vez que também aí, como na prestação de cuidados de saúde, há atrasos e listas de espera.

Embora este tema pareça esquecido, a verdade é que a Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed), além de não contar com recursos humanos suficientes, mantém um sistema desnecessariamente burocratizado que não lhe permite tratar com eficiência e justiça todas as solicitações necessárias a um eficaz acesso ao medicamento. A título de exemplo destaca-se o facto de haver medicamentos inovadores de particular relevância para a saúde, que levam um tempo infindável a ver os seus preços aprovados, e outro tempo ainda maior para definição do nível de comparticipação do Estado.

Os funcionários, embora altamente qualificados, são mal pagos e por isso facilmente aliciados pelo setor privado.

Permito-me recordar que em 2015 entrou em vigor o decreto- -lei n.oº 97/2015, de 1 de junho, que aprovava a existência do Sistema Nacional de Avaliação de Tecnologias de Saúde (SiNATS) que ficaria a ser gerido pelo Infarmed, e que surgiu com a finalidade de dotar o SNS de um instrumento único que aperfeiçoasse o seu desempenho e introduzisse as melhores práticas a nível europeu, no que se referia às tecnologias de saúde - medicamentos e dispositivos médicos. A ter sido aplicado na sua plenitude teria trazido ao SNS a eficiência, a celeridade, a justiça, a previsibilidade, bem como a sobrevivência de doentes perdidos neste laço de burocracias sem fim à vista, e teria ainda facilitado o trabalho das próprias empresas farmacêuticas.

O único entrave ao futuro que nessa data se desenhava como promissor foi o facto do SiNATS não ter chegado a ser aplicado em todas as vertentes, estando hoje muitos de nós a sofrer com a incapacidade de alguns (vá-se lá saber porquê), que conduziram à sua não total implementação.

Uma das principais funções do SiNATS era a avaliação da eficácia, da segurança e do custo-efetividade das tecnologias de saúde disponíveis no mercado, garantindo que os profissionais de saúde e os pacientes tivessem acesso a tratamentos e produtos de altos padrões de qualidade. Por outro lado, desempenharia um papel crucial na gestão dos recursos disponíveis no sistema de saúde. Ao analisar a relação custo e benefício das diferentes tecnologias, contribuiria para decisões informadas sobre alocação de recursos, promovendo a sustentabilidade do sistema de saúde português. Ao disponibilizar informações detalhadas sobre as avaliações realizadas, o sistema promoveria a transparência e consequentemente a confiança dos profissionais de saúde, pacientes e demais partes interessadas.

Muito mais haveria para dizer sobre o SiNATS enquanto ferramenta essencial para garantir a qualidade e a celeridade no acesso às tecnologias de saúde. O papel que se pretendia que viesse a desempenhar na avaliação, regulação e gestão eficiente de recursos teria contribuído significativamente para a excelência do Sistema de Saúde em Portugal.

Diria por isso que o novíssimo SNS deverá contar com um novíssimo Sistema de Regulação das Tecnologias da Saúde, designadamente medicamentos e dispositivos médicos, bem como os mais diversos equipamentos de saúde, em duas vertentes fundamentais:

• Os recursos humanos devem ser remunerados de forma digna e ajustada ao estatuto de regulador independente.

• O SiNATS deverá evoluir contando com o potencial da digitalização e inteligência artificial, devendo para o efeito ser atualizado e implementado em todas as suas vertentes, e desta vez, sem ser cerceado por preconceitos ideológicos.

QOSHE - O setor do medicamento também padece… - Eurico Castro Alves
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O setor do medicamento também padece…

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16.01.2024

À semelhança do Sistema Nacional de Saúde (SNS), também o setor do medicamento necessita de uma urgente e profunda reforma onde caiba a sua total reestruturação, uma vez que também aí, como na prestação de cuidados de saúde, há atrasos e listas de espera.

Embora este tema pareça esquecido, a verdade é que a Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed), além de não contar com recursos humanos suficientes, mantém um sistema desnecessariamente burocratizado que não lhe permite tratar com eficiência e justiça todas as solicitações necessárias a um eficaz acesso ao medicamento. A título de exemplo destaca-se o facto de haver medicamentos inovadores de particular relevância para a saúde, que levam um tempo infindável a ver os seus preços aprovados, e outro tempo ainda maior para definição do nível de comparticipação do Estado.

Os funcionários, embora altamente qualificados, são mal pagos e por........

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