Como já vai sendo tradição escrever cartas ao Pai Natal, não fossemos nós um povo de Maria vai com as outras ou seja de copiões, o velhinho das barbas brancas, vindo lá da Lapónia, é sempre reclamado nesta época; e esta tradição baseada está na figura de São Nicolau de Mira, século IV, padroeiro da Rússia, Grécia e Noruega, que ficou conhecido pela sua caridade e afinidade com as crianças; e, devido à sua generosidade e aos milagres que lhe foram atribuídos, foi canonizado pela Igreja católica.
Ora, nesta tradição do Pai Natal não me revejo, porque nos meus tempos e criança era o Menino Jesus que, na noite de Consoada aos meninos bem comportados, trazia qualquer coisinha sempre festejada e ansiada; e, então, lá íamos nós pôr na lareira, por baixo da chaminé, a bota ou o sapatinho que haviam de recolher o ansiado presente
que não ia muito além de uns rebuçados, uns chocolates, umas guloseimas.
Mesmo assim, porque respeito a tradição, lá vai o meu postal, não de criança mas de adulto, ao velhinho das barbas brancas.
Pai Natal:
Para mim pedir nada venho!
Daquilo que na vida é essencial,
Felizmente ainda eu tenho!
Mas, se andas a alimentar os sonhos das crianças,
Venho, aqui, reclamar solenemente
Que sejas Pai Natal para toda a gente!
Porque enquanto não houver
Em todos os corações um Natal a valer,
Nunca se operará o milagre tão urgente
De sermos mais iguais, num mundo tão diferente!
Tu nem existias quando eu era criança
E no bico da cegonha os bebés vinham de França!
Fazíamos, então, carrinhos de arame e bolas de trapos,
Jogávamos ao rapa, tira, deixa, põe
E escrevíamos cartas ao Menino Jesus,
Para que à nossa chaminé descesse
E no sapato, tamanco ou chanca pusesse
Figos, bolachas, rebuçados, nozes!
Era um tempo de sonho e encantamento
Vivido em Paz, Amor e doce fingimento!
Todavia, ao pardieiro do Zé
Porque nele não havia chaminé,
O Menino Jesus nunca descia.
Mas seu pai cada Natal lhe dizia
Com lágrimas nos olhos e voz a tremer:
- Olho Zé, que ainda um dia
O Menino Jesus cá vai descer.
Foram precisos muitos, muitos anos, afinal, que
Sobre nós passarem para que tu, Pai Natal,
Lá dos confins do mundo, da Lapónia,
Onde há sol à meia-noite e auroras boreais,
De longas barbas brancas cá chegasses
Com sacos de brinquedos e outras coisas mais
E para sempre quebrasses
Esse tempo de sonho e encantamento!
E de vez trocasses
O sortilégio do tamanco e da chaminé
Pela frieza, rigor e preconceito
Dum pinheiro grande todo feito
De embrulhos, bagatelas, coisas materiais
Com que agora se fazem os natais!
E mesmo assim no pardieiro do Zé
Não há embrulhos, nem o pinheiro reluz!
Mas porque, agora, já tem chaminé
É quase certo que o Menino Jesus
Vai devolver ao Zé e aos seus irmãos o merecimento
Desses tempos de sonho e encantamento
Que em nós fizeram tão lindos natais!
E tu num avião das linhas internacionais
Vais regressar de vez às auroras boreais!
Para mim pedir-te nada venho!
Porque enquanto não houver
Em todos os corações um Natal a valer,
Nunca se operará o milagre tão urgente
De sermos mais iguais num mundo tão diferente!
Então, bom Natal para todos e até de hoje a oito.