Daqui a poucos dias o PS escolhe o sucessor de António Costa, em eleições diretas. Cerca de 50 mil socialistas estão em condições de votar e serão esses militantes que vão decidir quem será o próximo secretário-geral do partido que é, por inerência, candidato a primeiro-ministro nas legislativas de 10 de março.

Depois de ter acabado com as primárias, que só serviram para fazer um golpe de Estado dentro do partido e para Costa ter apeado Seguro da liderança - depois de uma europeias em que o PS ganhou, mas em que o ainda primeiro-ministro acusou o líder do seu partido de ter ganhado por "poucochinho" -, ficaram apenas e só as diretas.

Há três candidatos, mas só dois, verdadeiramente, com condições de ganhar a eleição. Ambos reclamam a herança de Costa, ambos não criticam os últimos oito anos de governação, ambos prometem assumir o legado dos últimos oito anos. Mais uma vez, o PS não fez a autocrítica do que correu mal na governação, preferindo esconder debaixo do tapete o lixo deixado para trás durante quase uma década de poder. O partido fez o mesmo depois de Guterres e depois de Sócrates. No PS, não importa o tempo que passou, importa apenas e só o que está para vir.

Os dois principais candidatos têm feito um esforço de contenção verbal para não se atacarem mutuamente e para que a campanha interna não dê argumentos à oposição. Ainda assim, José Luís Carneiro considera que o seu principal adversário é "imaturo", enquanto Pedro Nuno Santos proclama que o seu competidor é "sonso".

Depois, a opinião pública e, sobretudo, a publicada, têm colado outros adjetivos aos dois homens que disputam o PS. Carneiro é tido como moderado, experiente, servidor público exemplar, capaz de dialogar com todos e não apenas com parte, discreto e competente. Já Pedro Nuno é visto como radical, corajoso, um homem de convicções, um decisor, inclinado a fazer acordos apenas e só à esquerda, uma vez que o PSD está demasiado, diz ele, radicalizado.

Ambos prometem que, ganhe quem ganhar, no dia seguinte o partido estará unido à volta do novo líder para ganhar as eleições de março. Bem sabemos que não será assim, mas em tempo de campanha interna com legislativas daqui a nada, não há outro discurso possível: o da unidade depois das diretas.

O "sonso" desafiou "o corajoso" para debates. Mas Pedro Nuno recusou. A sua autoproclamada e aplaudida coragem acaba no momento em que recusa estar frente a frente com os adversários. A justificação de que um debate entre dois camaradas daria argumentos à oposição é tão pífia como é fraco e imaturo o argumento de que Portugal poderia não pagar a dívida, o que deixaria "os banqueiros alemães com os joelhos a tremer".

As sondagens dizem que Pedro Nuno vai ganhar o partido, mas que Carneiro seria melhor candidato a primeiro-ministro. Nesta contradição de termos, nesta encruzilhada de caminhos, o PS dirá que futuro quer para o partido e, por consequência, que projeto para o país. Se um PS de portas fechadas à sua direita, encostado apenas à esquerda e aos velhos parceiros da geringonça, se um partido ao centro, capaz de dialogar à esquerda ou à direita, numa tentativa de ser a força política central no sistema partidário português.

Se o corajoso, afinal, não é assim tão corajoso e o sonso, afinal, não é assim tão sonso, apenas é um tipo de bom senso, que tipo de líder vai o PS eleger daqui a uns dias?

Seja qual for o candidato vencedor, era importante sabermos mais sobre o que ambos pretendem fazer, se chegados ao poder. Porque, desde 2015, deixámos de eleger primeiros-ministros, e estamos a votar em deputados de blocos ideológicos. E isto muda tudo, ainda que pareça que tudo fica na mesma.

Jornalista

QOSHE - O sonso e o corajoso - Pedro Cruz
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O sonso e o corajoso

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12.12.2023

Daqui a poucos dias o PS escolhe o sucessor de António Costa, em eleições diretas. Cerca de 50 mil socialistas estão em condições de votar e serão esses militantes que vão decidir quem será o próximo secretário-geral do partido que é, por inerência, candidato a primeiro-ministro nas legislativas de 10 de março.

Depois de ter acabado com as primárias, que só serviram para fazer um golpe de Estado dentro do partido e para Costa ter apeado Seguro da liderança - depois de uma europeias em que o PS ganhou, mas em que o ainda primeiro-ministro acusou o líder do seu partido de ter ganhado por "poucochinho" -, ficaram apenas e só as diretas.

Há três candidatos, mas só dois, verdadeiramente, com condições de ganhar a eleição. Ambos reclamam a herança de Costa, ambos não criticam os últimos oito anos de governação, ambos prometem assumir o legado dos últimos oito anos. Mais uma vez, o PS não fez a autocrítica do........

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