A direita agita-se com a possibilidade de voltar à governação, depois da crise aberta pela demissão de António Costa. Apesar de PSD e CDS terem ganhado as eleições pós troika, a geringonça tomou conta do hemiciclo e Costa governou oito anos. Sai pelo seu pé e a queda não foi por causa da oposição, nem do eleitorado, mas à custa de um processo judicial, dos vários buracos que foram aparecendo no Governo de maioria absoluta e das más escolhas do primeiro-ministro.

Marcelo, que por força da maioria absoluta tinha perdido protagonismo e centralidade na vida política, voltou a ser o centro das atenções. Os olhos estão voltados para Belém e para tudo o que o Presidente possa dizer ou fazer.

O próprio, impôs a si mesmo um silêncio, alegando que este é o tempo dos partidos, depois virá o tempo dos eleitores e, só depois, o tempo do Presidente. O mesmo Presidente que alertava, há meses, para a possibilidade de miniciclos eleitorais e de alguma instabilidade política. Mais cedo falara e, pela segunda vez em oito anos, Marcelo foi chamado a intervir e decidiu dissolver o Parlamento.

O que se segue está em aberto. Será no tempo dos eleitores, a 10 de março, como tem de ser, que a democracia vai dar a resposta à crise política. Os votos daqueles que se derem ao trabalho de ir votar decidirão a composição do próximo Parlamento. Por todas as razões, vale a pena lembrar que estamos a eleger deputados cuja maioria, então sim, dará origem a um novo Governo.

Quando chegar, outra vez, o tempo do Presidente, Marcelo terá o papel principal, respaldado no facto de ser eleito de forma direta, universal e nominal. A julgar pelas sondagens e estudos de opinião, é bem provável que o PS seja o partido mais votado, e que a direita tenha um maior número de deputados. Nesta quadratura do círculo, com as variáveis que já conhecemos em cima da mesa, e as que hão de juntar-se depois de contados os votos, o aviso, em tempo, dos miniciclos governativos não era manifestamente exagerado.

Montenegro diz que não governa com o apoio do Chega e que não governa se não ganhar eleições. O PS (de Pedro Nuno) está disposto a reatar a geringonça para poder governar. O PS (de José Luís Carneiro) diz que o Chega nunca chegará ao Governo se isso depender dos socialistas. O Chega, que continua a subir nas intenções de voto, não admite viabilizar um Governo à direita sem participar nele. Mas ninguém o quer como parceiro. O PCP e o Bloco esperam para perceber com que força eleitoral vão sair das urnas. Só depois disso podem ter margem para influenciar um acordo com o PS.

Ora, diante de todas estas variáveis, é bem provável que não cheguemos a lado algum. Sendo impossível fechar a circulatura do quadrado, entramos em terrenos do princípio de incerteza.

É aqui que entra Marcelo e a sua capacidade política. De leitura dos resultados, de análise da situação e de intuição. O que pode fazer o Presidente para, diante do cenário que parece ser o mais provável - PS a ganhar as eleições, direita com mais deputados, mas sem conseguir entender-se?

Marcelo está, também ele, com a cabeça a prémio.

Quando Sampaio dissolveu Santana, o povo deu-lhe razão com uma maioria absoluta ao PS; quando Marcelo dissolveu Costa, da primeira vez, o povo deu-lhe razão e respondeu com outra maioria absoluta ao PS. Desta vez, o povo não parece tão certo. E Marcelo pode chegar à conclusão de que não deveria ter dissolvido, antes aceitar a sugestão de Costa e do PS para a nomeação de outro primeiro-ministro. Um impasse no resultado ou uma incapacidade de formação de um Governo estável rebentará nas mãos do Presidente.

E agora, Marcelo?

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E agora, Marcelo?

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05.12.2023

A direita agita-se com a possibilidade de voltar à governação, depois da crise aberta pela demissão de António Costa. Apesar de PSD e CDS terem ganhado as eleições pós troika, a geringonça tomou conta do hemiciclo e Costa governou oito anos. Sai pelo seu pé e a queda não foi por causa da oposição, nem do eleitorado, mas à custa de um processo judicial, dos vários buracos que foram aparecendo no Governo de maioria absoluta e das más escolhas do primeiro-ministro.

Marcelo, que por força da maioria absoluta tinha perdido protagonismo e centralidade na vida política, voltou a ser o centro das atenções. Os olhos estão voltados para Belém e para tudo o que o Presidente possa dizer ou fazer.

O próprio, impôs a si mesmo um silêncio, alegando que este é o tempo dos partidos, depois virá o tempo dos eleitores e, só depois, o tempo do Presidente. O mesmo Presidente que alertava, há meses, para a........

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