A única e verdadeira coligação pré-eleitoral que existiu em Portugal foi a AD de Sá Carneiro e Freitas do Amaral. Depois de ter tentado um entendimento "de regime" com o PS e de este ter fracassado, Sá Carneiro agregou a direita com o objetivo de começar a construir um país novo, depois da revolução, do PREC e do pós-PREC.

O PPD e o CDS, juntos, lançaram a base do que acreditavam que viria a ser um Portugal moderno, social-democrata e democrata-cristão, centrado na Doutrina Social da Igreja, na economia de mercado (as empresas estavam quase todas nacionalizadas), no humanismo, no reformismo e na construção de uma sociedade liberta das grilhetas de uma ditadura de 48 anos e sem os constrangimentos de outra quase ditadura de sinal oposto, que o 25 de Novembro impediu.

Estavam certos. O povo, ainda pouco informado, mas sábio nas suas escolhas, deu maioria ao projeto da AD. E fê-lo porque acreditou naquele programa, naquela mensagem, naquelas pessoas. A coligação foi feita antes das eleições, depois de centenas de horas de conversa e discussão, para que o programa eleitoral refletisse a visão de sociedade de cada um dos partidos, sem que um e outro tivesse de ceder no essencial da sua doutrina.

Nestes tempos já tão distantes, o Congresso do PSD no fim de semana não fechou ainda a porta a coligações pré-eleitorais. Algumas destacadas vozes do universo social-democrata defendem, com unhas e dentes, esta solução para as próximas legislativas. Ao CDS, era o melhor que lhe poderia acontecer. Mesmo que mal negociado, um acordo com o PSD permitiria ao partido voltar ao Parlamento, com uma meia-dúzia de deputados e, desta forma, renascer dentro do hemiciclo.

Curiosamente, o PSD não quis decidir em congresso a politica de coligação para umas eleições que são daqui a 100 dias. Essa discussão vai ficar para o Conselho Nacional. O PSD ainda tem as portas abertas, o CDS quer entrar, mas a Iniciativa Liberal reafirmou já este fim de semana que não quer qualquer entendimento nem coligação pré-eleitoral, quer ir a votos sozinha, com as suas propostas, livre de amarras, de compromissos ou de cedências.

Faz mal.

Se o objetivo comum de PSD, CDS e IL é o de derrotar o socialismo e apear o PS do poder, só uma grande frente eleitoral de não-esquerda seria capaz de ter sucesso. Eleitoral e político.

Juntar os três partidos, conseguir um mínimo denominador comum e criar um programa político capaz de atrair o centro do eleitorado e ganhar eleições é uma tarefa difícil e complexa, mas não impossível. A dinâmica de uma coligação a três, as vantagens criadas pelo famoso e injusto Método de Hondt - que, ao converter votos em mandatos, no caso das coligações, limita o desperdício e permite um ganho de eleitos -, e o efeito novidade poderiam potenciar uma vitória eleitoral que, de outra forma, parece impossível.

Do outro lado, PS, PCP e Bloco não podem, nem devem, fazer o mesmo. Mas não precisam porque, se for caso disso, se a esquerda tiver maioria de eleitos, ainda na noite de 10 de março a coligação pós eleitoral está feita.

Numas eleições em que é muito provável que saiam soluções de miniciclos, como alertou o Presidente da República, era importante clarificar as águas e permitir aos eleitores uma escolha que não fosse apenas uma soma aritmética de votos e mandatos a posteriori. Não sendo assim, nem à esquerda, nem à direita, os líderes dos vários partidos terão de esclarecer, durante a campanha, como tencionam formar Governo. A lengalenga de sempre dos dirigentes dos vários partidos, de que "as eleições são a 10 de março" e que "não antecipam cenários", nem respondem a perguntas começadas por "Se", desta vez não colhe. Temos, ao ir votar, de saber exatamente o que nos espera. Só assim a escolha é como tem de ser. Livre, informada e consciente.

Jornalista

QOSHE - A grande coligação - Pedro Cruz
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A grande coligação

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28.11.2023

A única e verdadeira coligação pré-eleitoral que existiu em Portugal foi a AD de Sá Carneiro e Freitas do Amaral. Depois de ter tentado um entendimento "de regime" com o PS e de este ter fracassado, Sá Carneiro agregou a direita com o objetivo de começar a construir um país novo, depois da revolução, do PREC e do pós-PREC.

O PPD e o CDS, juntos, lançaram a base do que acreditavam que viria a ser um Portugal moderno, social-democrata e democrata-cristão, centrado na Doutrina Social da Igreja, na economia de mercado (as empresas estavam quase todas nacionalizadas), no humanismo, no reformismo e na construção de uma sociedade liberta das grilhetas de uma ditadura de 48 anos e sem os constrangimentos de outra quase ditadura de sinal oposto, que o 25 de Novembro impediu.

Estavam certos. O povo, ainda pouco informado, mas sábio nas suas escolhas, deu maioria ao projeto da AD. E fê-lo porque acreditou naquele programa, naquela mensagem, naquelas pessoas.........

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