Escrevi, há um par de semanas, sobre “o falhanço gráfico” visível nas escolhas formais para o novo símbolo adotado pelo Governo de Costa, já no seu final de mandato.
Hoje escrevo sobre o falhanço de andar para trás. Escrevo sobre o retrocesso visual e intelectual na escolha de se voltar a utilizar o anterior símbolo, que data do XIX Governo Constitucional, ou seja, da Legislatura de Passos.
Retrocesso intelectual aos olhos daquilo que é o assunto onde melhor sei esgrimir argumentos, que é o design. Porque aos olhos da política, quer-me parecer que a decisão não se aproxima nem de perto, nem de longe, de uma resolução fundamentada naquilo que o design gráfico pode, ou poderia!, trazer de bom a este e a qualquer outro Governo.
A decisão é claramente um sinal de conservadorismo encostado a uma direita tradicional, que é como quem diz, com a esfera armilar, com o escudo e com os símbolos de uma República ninguém brinca!
O Eduardo fez o seu melhor. Não brincou! Fez aquilo em que acreditava. Eu próprio escrevi no dito texto que o símbolo era pobre. Era omisso numa representação fiel e digna da “marca” Governo de Portugal (e não República, mas isso é assunto para outro texto!).
Mas uma identidade não vive só do seu símbolo. Vive do tipo de letra original, que seria o primeiro e exclusivo do Governo, vive das declinações visuais, vive de suportes de comunicação regrados e normalizados para contextos impressos e digitais. Vive de uma parafernália visual arquitetada para um fim muito específico: comunicar condignamente um Governo. E isso o Eduardo fez bem!
Um símbolo, um logótipo, uma sigla, por si só, não fazem um projeto, não definem uma identidade.
Nós, designers, queremos que a discussão seja sobre design. E queremo-lo bem! Queremos afirmar uma profissão que ainda não ultrapassou o patamar técnico, ao nível da Administração Pública.
Infelizmente continuamos a ser os tipos dos bonecos. Somos os sujeitos que desenham bem, a quem é fácil traduzir conceitos complicados, crenças e ideais intrincados num simples rabisco, num símbolo. Somos os indivíduos que criamos as cadeiras onde os ministros se sentam, antes delas existirem, somos os indivíduos que concebemos o mundo fabricado, que definimos a cultura material, que contribuímos para a definição visual e formal de uma época, de uma década, de um recorte cronológico. Mas continuamos na sombra, o que prova que só nós entendemos que este retrocesso visual é mau. Nem os media nos chamaram para discutir o assunto enquanto especialistas. E porquê?
Porque a decisão é política. Repito: política.
A decisão é fazer reset com um passado socialista. É fazer um reboot conservador, antigo, contra o que é diferente e radical. É fazer um reiniciar à máquina governativa.
O Governo quando toma a decisão, acredito que não entende o verdadeiro poder do design. E é por isso que os designers, os publicitários e todos os profissionais da imagem estão em agonia: não nos ouviram, não nos respeitam, e o pior de tudo é fazerem sentir que o nosso trabalho é tão descartável quanto uma lata de refrigerante depois de a bebermos.
Mas esta é a verdade com a qual não queremos lidar: o nosso trabalho pode ser descartável. Mas o que não pode acontecer, diria eu, é descartarmos um artefacto sem termos o verdadeiro conhecimento sobre ele. Sem o entender. Sem cogitar quais as possibilidades que ele nos pode trazer. A isto chama-se ignorância.
No entanto eu, designer, quero perdoar, ou pelo menos tentar! Porque quero acreditar que esta decisão foi só uma decisão política.
Baseada na ignorância, certo, mas só, e apenas, política.
O Governo fez um reset na política... e no design também!
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10.04.2024
Escrevi, há um par de semanas, sobre “o falhanço gráfico” visível nas escolhas formais para o novo símbolo adotado pelo Governo de Costa, já no seu final de mandato.
Hoje escrevo sobre o falhanço de andar para trás. Escrevo sobre o retrocesso visual e intelectual na escolha de se voltar a utilizar o anterior símbolo, que data do XIX Governo Constitucional, ou seja, da Legislatura de Passos.
Retrocesso intelectual aos olhos daquilo que é o assunto onde melhor sei esgrimir argumentos, que é o design. Porque aos olhos da política, quer-me parecer que a decisão não se aproxima nem de perto, nem de longe, de uma resolução fundamentada naquilo que o design gráfico pode, ou poderia!, trazer de bom a este e a qualquer outro Governo.
A decisão é claramente um sinal de conservadorismo encostado a uma direita tradicional, que é como quem diz, com a esfera armilar, com o escudo e com os símbolos de uma........
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