A parceria entre a Associação Académica de Coimbra e o Organismo Autónomo de Futebol (OAF) para a impressão de um cravo, junto ao símbolo oficial, nas camisolas do jogo como forma de celebrar os “50 anos do 25 de Abril de 1974” parece ter-se transformado numa questão controversa. Li algumas opiniões discordando com este gesto, vindo até de pessoas que respeito e admiro. Todavia, de quem agora discordo.
Este ano o país desdobra-se em celebrações e homenagens à “Revolução dos Cravos”. Há-as para todos os gostos. Neste caso, um gesto muito simbólico refletido na camisola de uma instituição que pela sua natureza contribuiu e muito para a conquista de liberdades. A Académica de Coimbra tem uma história que se confunde com a afirmação de direitos e valores fundamentais.
Os que estão, hoje, contra a simples inclusão de um cravo, símbolo de Abril, junto ao emblema da AAC invocam o facto histórico de, em 20 de junho de 1974, uma Assembleia Magna de estudantes ter decidido a extinção da secção de futebol, quando os atletas se encontravam numa digressão em Espanha. Isto é um facto, resultante de um contexto pós-revolucionário em que a extrema-esquerda ganhou relevo no ambiente estudantil e académico. Em Coimbra, como no resto do país.
Em consequência, nascia o Clube Académico de Coimbra (CAC) que representou o futebol nas provas oficiais até 1984, altura que marca o “regresso à casa-mãe” e surgiu assim a AAC/OAF. Estes factos ocorreram há cinco e quatro décadas, tempo suficiente para “baixar a poeira”.
O 25 de Abril em muitas das suas dimensões permitiu a consolidação democrática e uma reconciliação do país consigo mesmo. Com algumas coisas boas e outras menos boas. Este ano celebramos tudo isso. Deve falar-se abertamente, mas sem ódios, recriminações ou revisionismos históricos.
Não entendo sinceramente como a inserção de um cravo – símbolo de democracia e liberdade! – na camisola de uma instituição (sim, porque gostamos de dizer que somos muito mais que um clube) pode ser objeto de polémica e de ajustes de contas com a história. Passaram cinco décadas!..
Enfim, preocupa-me muito a polarização crescente da sociedade portuguesa, de que esta discussão será um bom exemplo. Com certeza, o atual contexto politico-eleitoral ajuda a exacerbar sentimentos, mas nada justifica o que tenho lido (sobretudo nas redes sociais) em que a razão parece estar apenas de um lado. Uns são os bons, os outros os maus; uns são os esquerdalhos e os outros reacionários.
O 25 de Abril é o oposto de tudo isto. E a Académica de Coimbra/OAF também!

QOSHE - Académica, cravos e futebol - Ricardo Castanheira
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Académica, cravos e futebol

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19.02.2024

A parceria entre a Associação Académica de Coimbra e o Organismo Autónomo de Futebol (OAF) para a impressão de um cravo, junto ao símbolo oficial, nas camisolas do jogo como forma de celebrar os “50 anos do 25 de Abril de 1974” parece ter-se transformado numa questão controversa. Li algumas opiniões discordando com este gesto, vindo até de pessoas que respeito e admiro. Todavia, de quem agora discordo.
Este ano o país desdobra-se em celebrações e homenagens à “Revolução dos Cravos”. Há-as para todos os gostos. Neste caso, um gesto muito simbólico refletido na camisola de uma instituição que pela sua natureza........

© Diário As Beiras


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